Num cenário onde o virtual e o inglês imperam, você já deve ter ouvido falar sobre candidate experience (em português, experiência do candidato). Se ainda não ouviu, com certeza ouvirá. Isso porque o candidate experience é uma informação relevante quando o assunto é recrutamento e seleção.
Já não estamos mais num mundo de “mande seu currículo e torça para não receber um ‘não’ na sua cara!” Hoje em dia, as percepções do candidato sobre o processo seletivo são importantes e podem contribuir para várias estratégias de uma organização.
Estima-se que 71% das pessoas empregadas estão procurando ativamente um novo emprego. E 65% delas voltam buscar novas vagas em até 90 dias após a contratação.
Além disso, as organizações estão sendo observadas e avaliadas como potenciais empregadoras, mesmo quando não há vagas atuais. Um levantamento do Glassdoor, em 2016, mostrou que 61% dos usuários conferias as avaliações da empresa antes de tomar a decisão de se candidatar a um emprego.
Assim, o candidate experience é algo importantíssimo nos dias de hoje!
Ficou curioso em saber melhor do que se trata esse conceito e como usá-lo a seu favor? Quer entender por que um processo seletivo fácil não é sinônimo de uma boa experiência do candidato?
Então este texto é feito para você!
1. Afinal, o que é candidate experience?
Experiência do candidato (do inglês, candidate experience) é a maneira como os candidatos percebem e reagem aos processos de recrutamento, entrevista, contratação e onboarding de uma empresa. Embora não haja uma definição realmente “oficial”, é possível entender esse termo a partir dessa descrição.
Assim, após o passarem por um processo de recrutamento e seleção, candidatos naturalmente saem com opiniões, sensações, percepções e reações sobre aquilo que acabaram de realizar. E esse conjunto de sentimentos que permanecem ao longo do tempo, juntamente com as ações feitas pelos candidatos, determinam aquilo que chamamos de candidate experience.
Mas quais ações? Por exemplo, a ação de entrar na página da empresa para se sentir mais próxima a ela. Ou a ação de contar aos seus colegas como o processo seletivo é bacana, com testes psicométricos interessantes e uma devolutiva explicativa. Ou então ir ao Google para dar uma nota alta à empresa, deixando um comentário positivo sobre sua experiência.
Vai contratar uma testes de seleção? Então tenha em mãos as perguntas a serem feitas antes de contratar essa bateria!
Esses são todos exemplos de reações positivas após uma boa experiência do candidato. Porém, pode ser que a experiência não tenha sido tão boa assim — e as reações seguirão a mesma linha.
O candidato pode “falar mal” da empresa para os seus amigos e colegas de trabalho. Pode atribuir uma nota baixa no Google. E pode mandar um e-mail reclamando da forma desrespeitosa com a qual se sentiu tratado.
Como evitar que isso aconteça? É o que veremos mais para frente. Neste momento, vamos esclarecer as razões pelas quais você deve se atentar ao candidate experience da sua organização. Já demos um spoiler agora há pouco, mas vamos entrar nessa discussão de maneira mais direta.
2. Por que é relevante estudar esse tema?
Entender o conceito de candidate experience é o primeiro passo para compreender por que as empresas estão se preocupando com isso. Elas já perceberam que os impactos na estratégia organizacional são reais e mensuráveis.
Se a percepção ou reação do candidato é ruim após passar pelo processo seletivo da empresa, o que pode acontecer?
- Reputação da organização é afetada – As reações ruins ao processo costumam “esparramar” para outras áreas, fazendo com que toda a empresa seja avaliada de forma negativa. Com o passar do tempo, isso vai se consolidando no imaginário das pessoas. E uma vez consolidado, é bem difícil mudar. Todos nós conhecemos empresas com reputações ruins, não é mesmo?
- Impacto na guerra de talentos – A empresa perdedora diminui seu potencial de enriquecer o capital humano. Maiores talentos começarão a pensar duas (ou mais) vezes antes de querer entrar naquela empresa.
- Perda de dinheiro – Com uma reputação abalada e dificuldades para atrair talentos, sua organização contará com menos patrocínio, menos interesse de investimentos e parcerias. E provavelmente menor taxa de produtividade, já que os maiores talentos estão indo para a concorrência.
Search vs. Hunting
De acordo com Peter Cappelli, diretor do Centro de Recursos Humanos da Wharton:
Os dados do censo mostram, por exemplo, que a maioria das pessoas que aceitaram um novo emprego em 2019 não estavam procurando por um emprego: eles foram selecionados via hunting.
Hunting (do inglês, “caça”) é a busca por talentos ideais feitos para uma vaga em aberto. Essa busca geralmente é realizada por meio dos chamados headhunters (consultores). Ou seja, agentes que prestam assessoria a empresas durante o processo seletivo.
Já o search é o recrutamento tradicional, que ocorre via currículo ou processo seletivo em várias etapas. Ele não requer que haja alguém especializado em “caça” de talentos. As vagas são anunciadas e os candidatos vão se prontificando a realizar a seleção.
Mas o que essa diferença diz sobre candidate experience? Diz o seguinte: o processo de hunting tem, em geral, resultados mais favoráveis em termos de experiência de candidatos. Como já é algo direcionado, o candidato “caçado” tem alta chance de ser realmente contratado.
Porém, o investimento em hunting geralmente é elevado. E nem sempre é simples de ser feito, especialmente quando não são necessários requisitos muito específicos para a vaga.
Dessa forma, o candidate experience da sua organização não pode ficar “refém” de uma seleção por hunting. Sua empresa precisa trabalhar com isso independentemente da forma como o pool de talentos é selecionado.
3. Alguns números impressionantes
Num artigo publicado pelo FMI, foi demonstrado que até 2030 haveria uma escassez global de mais de 85 milhões de trabalhadores de tecnologia.
E sabe qual o custo disso? Simplesmente US$ 8,5 trilhões em receita anual perdida! Sim, você não leu errado. Oito trilhões de dólares! É algo de outro mundo!
O artigo descreve uma combinação de fatores capazes de levar a uma guerra global de talentos. E mostra como há um grande desnível entre a oferta de talentos (para áreas tecnológicas) em Israel e na Europa Oriental — e a escassez de talentos nos EUA e na Rússia.
De acordo com a pesquisa Global Human Capital Trends da Deloitte, 70% dos entrevistados citaram o recrutamento como uma questão importante. E 61% acabaram concordando que encontrar candidatos qualificados e experientes é o maior desafio enfrentado por eles no processo de seleção.
A Virgin Media, uma provedora britânica de serviços de televisão, telefone e internet, quantificou os custos de uma experiência ruim de candidatos. Sabe quanto custa à sua marca? US$ 6 milhões em receita perdida anualmente! É realmente um número impressionante.
Alguns desses custos são atribuídos a relacionamentos perdidos e a uma marca empregadora danificada. Portanto, a um baixo candidate experience. O que acaba comprometendo a capacidade da empresa em atrair os melhores talentos.
E para finalizar, num outro estudo, realizado em março de 2019, foram pesquisados mais de 4.000 candidatos, em todos os setores, gerações e níveis de trabalho, que se candidataram a um emprego nos últimos 24 meses.
4. O que sabemos sobre o candidate experience?
Há uma série de razões práticas, econômicas, legais e psicológicas para as organizações prestarem atenção à forma como os candidatos reagem aos sistemas de seleção. Podemos citar algumas delas:
- Candidatos descontentes podem desenvolver uma visão negativa da organização e podem comunicar essa percepção aos indivíduos em suas redes profissionais e sociais
- Candidatos que vejam o processo seletivo como invasivo podem se retirar do pool de seleção
- As reações negativas influenciam as atitudes e comportamentos de trabalho dos candidatos uma vez que são contratados no cargo
- Procedimentos seletivos inadequados podem fazer com que os candidatos apresentem queixas ou tomem medidas legais
- Experiências negativas durante o processo seletivo podem ter efeitos prejudiciais sobre o bem-estar do candidato.
Todos esses pontos foram conferidos na prática. Com as evidências em mãos, especialistas da área buscaram mapear quais são os principais aspectos do processo seletivo do ponto de vista do candidato.
Ao longo das pesquisas, foi verificado que candidatos percebem os procedimentos de contratação como sendo justos. Dois tipos de justiça foram observadas.
Por um lado, a justiça processual à equidade de como as decisões são tomadas (ou seja, se o processo de contratação em si é justo).
Por outro, a justiça distributiva à se concentra na percepção dos candidatos sobre os resultados recebidos (ou seja, foi a decisão de contratar ou não a contratação justa).
Assim, conseguimos entender qual é a melhor abordagem para melhorar a experiência do candidato. E, como você deve imaginar, não é pela “facilitação” do processo. Veremos isso adiante!
4. Candidate experience ruim: isso está manchando a sua marca?
Bom, depois de tudo o que vimos, as perguntas que não querem calar são: “Ok, será que minha empresa está com uma experiência de candidatos ruim? E isso está afetando a minha marca?”
São questões que precisam ser respondidas o quanto antes. E para facilitar as coisas para você, nós vamos te ajudar. Em primeiro lugar, considere as seguintes premissas:
- Candidatos investem tempo e energia na busca por locais de trabalho que façam sentido para eles (tanto em termos de carreira quanto em interesse). Durante os processos de seleção, candidatos também investem tempo e energia para seguir pelas etapas. Ou seja, eles estão em constante processo de tomada de decisão.
- Empresas estão buscando talentos para preencher suas posições. Isso significa investir em uma série de iniciativas de atração e etapas de seleção que engajem o candidato.
São duas premissas absolutamente corretas, concorda? Candidatos estão em busca de empresas que sejam do seu interesse. E empresas estão buscando candidatos que sejam do seu interesse.
Em cada etapa do recrutamento, os candidatos formam percepções e sentimentos em relação aos processos, práticas, informações e pessoas da organização.
Essas trocas são a base a partir da qual a experiência do candidato é determinada. E o candidato decide continuar no processo seletivo ou sair dele.
É importante ter em mente — dependendo da experiência do candidato — que, se o processo for excessivamente demorado, os candidatos podem perder o interesse. Manter o interesse e a atração do candidato é imprescindível para poder avaliar melhor suas capacidades.
Não caia nessa! O processo seletivo não deve ser fácil!
Acabamos de dizer que é importante manter a atenção do candidato. Só assim é possível fazer com que ele esteja engajado e responda às questões com toda a sua dedicação.
Porém, e isso é fundamental, o processo seletivo não precisa ser fácil para melhorar o candidate experience. Não precisa e não deve!
Processo seletivo fácil não é sinônimo de boa experiência do candidato!
Isso é uma saída simples para um problema complexo. E como diria Henry Louis Mencken: “Para todo problema complexo, existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada.”
Facilitar o processo seletivo é uma solução errada. O processo tem que ser bem feito, bem estruturado e com todas as informações necessárias.
5. Então, o que fazer para melhorar a experiência do candidato?
Como dissemos, você não deve facilitar o processo na tentativa de melhorar experiência do candidato. O que eles estão buscando não é um processo fácil, bobo, sem conteúdo e que falhe em selecionar os melhores talentos.
O processo seletivo deve continuar sofisticado e com o número certo de etapas. Deve contar com uma robusta bateria de testes psicométricos e com entrevistas. Deve mensurar as características, habilidades e comportamentos do candidato.
Tudo isso pensando naquilo que é o mais importante: uma contratação eficaz e justa! Os candidatos mais adequados devem ser selecionados. E o menos adequados devem ser integralmente informados do porquê de não avançarem para as próximas fases.
Aliás, saiba que durante o processo, o candidato continuará buscando informações sobre a organização. O fornecimento de informações adicionais ajudará no comportamento de busca do candidato e fortalecerá o relacionamento com a organização.
Deve-se notar, assim como a organização está olhando para todos os candidatos, os candidatos também estão olhando para outros empregadores.
A percepção de justiça e relevância do processo é fundamental para continuar a oferecer uma boa experiência de candidato, assim como comunicar os próximos passos para a tomada de decisão.
Principais pontos
- Oferta à esta etapa tem dois elementos que influenciam a experiência do candidato. A primeira é a oferta que é propriamente feita. O segundo é informar os demais candidatos que não foram selecionados.
- Uma oferta é estendida normalmente de uma das três maneiras: oferta competitiva, oferta lowball e oferta best-shot
- Uma vez que um candidato aceita a oferta, os demais são notificados. Eles investiram tempo e energia para chegar tão longe no processo. A relação foi ampliada e a experiência do candidato será impactada pela percepção da equidade do processo seletivo e da decisão. Além disso, a organização identificou bons talentos que pode querer que se candidatem novamente ou que podem ser qualificados para outra posição. Neste momento, os candidatos estão esperando o encerramento e os próximos passos.
- A importância da experiência do candidato durante o processo de recrutamento é fundamental na busca da organização para vencer a guerra de talentos. Sendo assim, o processo de recrutamento tem um objetivo duplo: contratar candidatos de qualidade e garantir uma experiência positiva do candidato
- Entender os pontos de contato que formam a base para um relacionamento entre o processo de recrutamento da organização e o candidato auxilia as organizações a fornecer uma experiência positiva ao candidato que resulta em uma marca empregadora positiva e melhores resultados de negócios.
- Alguns desses resultados de negócios incluem o fortalecimento do relacionamento com todos os candidatos, pois eles podem ser ou se tornar clientes ou investidores, podem indicar amigos para a empresa, e participar de futuras vagas na empresa.
- Deve-se notar que experiências positivas também são compartilhadas no domínio público, proporcionando força e credibilidade à marca empregadora da organização.
As 10 regras de Gilliland
Grande parte deste trabalho foi impulsionado pelo modelo de reações de candidatos do professor Stephen Gilliland (1993).
Esse modelo prevê que a equidade do sistema de seleção pode influenciar atitudes dos candidatos (por exemplo, atratividade organizacional), intenções (por exemplo, recomendar as organizações a terceiros, tomar medidas legais) e comportamentos (por exemplo, desempenho em entrevistas ou testes).
Gilliland propôs um total de 10 “regras” que aumentam o candidate experience do ponto de vista do candidato:
- Certifique-se de que as etapas do processo estão relacionadas ao trabalho
- Dê aos candidatos a oportunidade de se apresentarem ou mostrarem o que sabem
- Dê aos candidatos a oportunidade de contestar seus resultados
- Certifique-se de que os procedimentos são consistentes entre todos os candidatos
- Forneça aos candidatos um feedback útil e oportuno
- Forneça explicações e justificativas para procedimentos ou decisões
- Certifique-se de que os recrutadores sejam honestos ao se comunicar com os candidatos
- Certifique-se de que os recrutadores tratem os candidatos com carinho e respeito
- Apoie um processo de comunicação bidirecional
- Certifique-se de que todas as etapas são legais e não discriminatórias por natureza.
6. Como a tecnologia impacta a reação dos candidatos?
Diante de inúmeras vantagens tecnológicas, é fundamental que as organizações desenvolvam abordagens estratégicas para a forma como aplicam esses recursos ao longo dos processos.
Não só o tipo de tecnologia serve como um sinal para os candidatos sobre a organização (se se seria um bom lugar para trabalhar), mas também a extração e uso de informações on-line não relacionadas ao trabalho pode resultar em preocupações de privacidade do candidato.
Dessa forma, preparamos para você uma checklist de práticas recomendadas. Seu sistema de seleção atual está definido para promover reações bem sucedidas? Se sim, ele deve ser projetado para que esteja…
- Fornecendo explicações informativas aos candidatos.
- Dando aos candidatos a chance de mostrar o que sabem.
- Usando métodos de seleção relacionados ao trabalho.
- Usando métodos de seleção baseados em evidências científicas sólidas.
- Dando feedback oportuno/em tempo hábil.
- Dando feedback informativo.
- Tratando os candidatos com o devido respeito durante todo o processo seletivo.
Com isso, você terá um processo seletivo eficaz, justo e bem aceito pelos candidatos. Facilitar as etapas só vai trazer frustração para ambos: para a empresa, porque não vai contratar os talentos mais adequados, e para os candidatos, porque não sentirão justiça no processo seletivo.
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