Como os vieses inconscientes influenciam decisões na gestão de pessoas

vieses inconscientes

No ambiente corporativo, decisões precisam ser rápidas, mas também justas e fundamentadas. 

Na prática, entretanto, muitos julgamentos do dia a dia são influenciados por vieses inconscientes, atalhos mentais que usamos sem perceber. 

Quando não reconhecemos esses vieses, corremos o risco de tomar decisões sem, ou com pouca base sólida, que resultam no impacto nos negócios da empresa — prejudicando a capacidade de inovar e se adaptar ao mercado. 

Por isso, entender como esses mecanismos funcionam e saber como reduzi-los na prática é fundamental para construir processos mais imparciais, estratégicos e alinhados aos objetivos do negócio.  

Continue lendo o conteúdo para entender o conceito, como isso afeta empresas, e ferramentas para combater os vieses cognitivos

O que são vieses inconscientes? 

Vieses inconscientes (também chamados de vieses cognitivos) são resultado de um processo natural e automático do cérebro humano.  

São formulações criadas a partir das nossas experiências e observações que interferem no nosso julgamento e tomada de decisão

Os vieses inconscientes acontecem porque, a partir dessas vivências práticas, nosso cérebro vai criando atalhos mentais para simplificar nosso raciocínio e basear nossas escolhas — esse processo, inclusive, é chamado de heurística. 

A base dos vieses: entendendo heurísticas 

Entendendo o conceito de heurística e vieses inconscientes, percebe-se que nem todas as decisões tomadas são baseadas em uma lógica objetiva e racional.  

Isso acontece justamente para poupar tempo e energia, já que nosso cérebro não teria condições de processar cada situação com profundidade, considerando todos os dados e variáveis disponíveis

Em vez disso, vamos construindo percepções e julgamentos com base no nosso repertório, que é moldado por fatores culturais, sociais, econômicos e pessoais

Segundo Kahneman, um estudioso no qual vamos nos aprofundar no próximo tópico, todo atalho é está sujeito a erros sistemáticos: é a natureza da heurística

Um exemplo prático de vieses inconscientes: durante uma dinâmica de grupo, uma avaliadora vê a tatuagem de um time rival no braço de um candidato e, sem perceber, sente menos afinidade com ele. 

A partir disso, ela tem uma postura menos interessada no candidato, e vê pequenos erros que ele cometeu como muito mais graves do que realmente são.  

A partir disso, a avaliação que ela fez sobre a performance dele é pior do que realmente foi. 

Esse é um caso clássico do efeito horn, conceito descrito por Edward Thorndike, que vamos aprofundar mais adiante. 

Os sistemas de pensamento que influenciam a formação de vieses  

Os grandes estudiosos por trás do conceito e impactos de vieses inconscientes são Daniel Kahneman (ganhador do Prêmio Nobel pelas suas contribuições no assunto) e Amos Tversky.  

O livro Rápido e Devagar – duas formas de pensar (Thinking, Fast and Slow, no idioma original), publicado em 2011, determina que existem dois sistemas a partir dos quais nosso raciocínio é formado. 

  • Sistema 1: é intuitivo, inconsciente, emocional, rápido e “sem esforço” envolvido. 
  • Sistema 2: o pensamento é racional, lento, deliberado, sistemático, e “com esforço”. 

Naturalmente, qualquer tipo de raciocínio, seja pelo sistema 1 ou 2, demanda trabalho do nosso cérebro.  

A diferença está praticamente relacionada as sensações: as decisões ou entendimentos resultantes do sistema 1 parecem mais automáticas, como se demandassem menos atividade mental — diferentemente do que acontece com o sistema 2.  

Vieses cognitivos precisam ser evitados? 

É importante entender que esses pré-julgamentos que impactam nossas decisões e percepções podem surgir de qualquer um dos sistemas apontados acima. Kahneman afirma que ambos os sistemas estão sujeitos a erros, e cada um de formas diferentes. 

Os julgamentos resultantes desses sistemas (especialmente do primeiro) não são totalmente inúteis, mas precisam ser identificados e analisados: isso porque, quando são a única lente pela qual as decisões são tomadas, podem afetar a qualidade das escolhas e trazer consequências.  

Quais são os principais vieses cognitivos e como aparecem? 

Como vimos, os vieses inconscientes são moldados não só pelas vivências individuais, mas também por fatores culturais, sociais e coletivos. 

Fica claro, então, que essas pré-concepções não aparecem somente pelas experiências, mas também pelas percepções mais fortes compartilhadas por um grupo específico. 

Por que isso é importante? Porque um indivíduo pode acabar sendo afetado pelos vieses ao seu redor — mesmo que, inicialmente, nem compartilhasse daquele pré-julgamento. 

A seguir, conheça alguns dos vieses mais comuns no ambiente corporativo

Viés de confirmação 

Viés de confirmação é a tendência de buscar, interpretar e lembrar informações que confirmam o que já acreditamos, ao mesmo tempo em que ignoramos ou minimizamos dados que vão contra essas expectativas. 

No recrutamento, por exemplo, isso pode acontecer quando um gestor parte do pressuposto de que candidatos formados em universidades renomadas são mais qualificados. 

A partir daí, ele tende a focar apenas nos pontos fortes desses perfis, enquanto desconsidera candidatos de outras instituições, mesmo que tenham competências semelhantes ou até mais aderentes à vaga.  

Esse padrão foi demonstrado nos estudos do psicólogo Peter Wason (1960), que evidenciou como as pessoas testam hipóteses de maneira enviesada, buscando confirmação em vez de questionamento.  

Efeito halo e efeito horn 

Esses dois efeitos ilustram como uma característica isolada pode distorcer a percepção geral sobre uma pessoa. 

  • Efeito Halo: uma qualidade positiva, como boa comunicação ou aparência agradável, leva à supervalorização das demais competências do candidato; 
  • Efeito Horn: o oposto ocorre quando uma característica negativa, como timidez ou um erro pontual, compromete toda a avaliação, mesmo sem relação com a função. 

O conceito foi originalmente descrito por Edward Thorndike (1920), que identificou esses desvios de julgamento em contextos militares — mas que é replicado em ambientes organizacionais até hoje.  

Viés de autoconveniência (Self-serving Bias)  

Esse viés faz com que as pessoas atribuam seus sucessos a qualidades pessoais, como esforço, talento ou dedicação, e coloquem a culpa dos fracassos em fatores externos, fora do seu controle. 

A lógica é: “se não deu certo, foi por causa das circunstâncias”. Essa distorção protege a autoestima, mas pode comprometer a clareza das análises. 

Nas avaliações de desempenho, é comum que tanto gestores quanto colaboradores recorram a esse mecanismo — seja para justificar uma nota abaixo do esperado, uma decisão ou um feedback negativo. 

No processo seletivo, candidatos podem minimizar seus erros ou atribuir demissões a “problemas da empresa anterior”, enquanto supervalorizam conquistas que não são totalmente atribuíveis a si.  

Viés de similaridade (Affinity Bias) 

O viés de similaridade ocorre quando favorecemos inconscientemente pessoas que compartilham características conosco — seja trajetória acadêmica, gostos pessoais, origem social ou até o time de futebol.  

Nesse contexto, o perfil completo do candidato deixa de ser considerado, e somente esses aspectos positivos são enxergados. 

Esse comportamento reforça padrões de contratação, dificultando a diversidade e a inovação nas equipes. É comum, por exemplo, um recrutador optar por um candidato que estudou na mesma universidade ou tem estilo de vida parecido, mesmo que o critério não tenha relação com o desempenho esperado.  

Viés de ancoragem 

Nesse viés, a primeira informação recebida — chamada de “âncora” — exerce influência desproporcional sobre todo o julgamento posterior. Mesmo quando irrelevante, ela tende a moldar nossa percepção. 

No recrutamento, um exemplo recorrente é o uso da pretensão salarial como âncora. Ao escutar o valor sugerido pelo primeiro candidato, o avaliador pode considerar os demais como caros, baratos, preparados ou despreparados com base nesse referencial inicial, e não em critérios objetivos.  

Viés de recência 

A tendência de lembrar mais facilmente de eventos ou candidatos vistos por último é chamada de viés de recência. Ela afeta a memória e a avaliação, favorecendo os últimos entrevistados ou os eventos mais recentes no histórico de um profissional. 

Na prática, o recrutador pode considerar o candidato recentemente entrevistado como “o melhor”, não necessariamente por desempenho, mas porque a lembrança está mais fresca e acessível.  

Viés de aversão à perda 

Esse viés é caracterizado pelo medo de perder mais do que a expectativa de ganhar.  

Em contextos de gestão de pessoas, ele se manifesta como resistência à mudança, mesmo quando ela é necessária. 

Exemplo típico: manter um funcionário com desempenho mediano por receio de errar ao contratar um novo colaborador. Esse comportamento conservador pode comprometer o crescimento e a inovação da equipe, favorecendo escolhas seguras, mas pouco estratégicas. 

Efeito de ordem (Primacy/Recency Effect) 

Esse efeito se refere à tendência de lembrarmos com mais clareza das primeiras e últimas informações apresentadas — em detrimento das intermediárias. 

Em processos seletivos, isso pode significar que o primeiro e o último candidato entrevistados sejam mais facilmente lembrados e, portanto, tenham avaliações distorcidas em relação ao grupo.  

A ordem das entrevistas, currículos ou apresentações pode afetar o julgamento, mesmo quando todos os demais fatores são controlados.  

Como os vieses inconscientes afetam o RH? 

Como observado pelos exemplos práticos do tópico anterior, os vieses interferem nas diferentes áreas de atuação dentro do time de RH.  

Embora os vieses sejam produzidos inconscientemente, isso não significa que o time de gestão de pessoas deixa de ter influência e condição de combater esses pré-julgamentos. 

Veja algumas ações com impactos práticos nessas diferentes etapas. 

Recrutamento e seleção 

Vieses como o de confirmação, halo e similaridade distorcem a análise de currículos e entrevistas

Informações como foto, sobrenome, idade ou universidade geram julgamentos prévios, mesmo sem evidências objetivas de desempenho. 

Nova call to action

Avaliação de desempenho  

O viés de recência leva a valorizar comportamentos recentes em detrimento do desempenho consistente ao longo do tempo.  

Já o viés de autoconveniência pode afetar a imparcialidade de quem avalia, atribuindo méritos ou falhas de forma enviesada.  

Promoções e reconhecimentos  

Quando decisões são influenciadas por afinidade pessoal, interesses em comum ou histórico compartilhado, deixando de lado critérios técnicos e meritocráticos. 

O viés de ancoragem também pode fazer com que avaliações antigas sejam prevalecentes, mesmo quando o desempenho atual mudou. 

Desligamentos e retenção  

Neste caso, a aversão à perda faz com que gestores evitem mudanças necessárias, enquanto o efeito horn pode resultar em demissões precipitadas por falhas pontuais, desconsiderando o potencial do colaborador

Por que é tão difícil identificar esses vieses? 

vieses

Os processos de formação de heurísticas, vieses inconscientes e até os dois sistemas de raciocínio listados por Kahneman são fruto de processos automáticos, involuntários, e naturais do ser humano. 

Nossos entendimentos são moldados por uma vida inteira de contextos, fatores e experiências. Os pré-julgamentos têm seu lado positivo: por exemplo, é importante saber celebrar as próprias conquistas e reconhecer quando suas ações trouxeram impactos positivos. 

O aspecto negativo trazido pelo viés de autoconveniência, por exemplo, é quando essa autoestima prejudica a autoanálise, e impede que um funcionário avalie com discernimento quais atitudes teve que trouxeram uma performance ruim. 

Se esse colaborador não se desvencilhar desse tipo de viés, pode acabar culpando fatores externos pelos seus resultados alcançados quando, na verdade, cabe um plano corretivo de ação.  

Como reduzir o impacto dos vieses cognitivos no RH? 

Apesar de serem fruto de processos inconscientes, isso não significa que o RH não pode mobilizar estratégias para combater pré-julgamentos e as consequências limitantes trazidas pelos vieses. 

  • Padronize entrevistas e critérios de avaliação: use roteiros com perguntas iguais para todos os candidatos e defina critérios objetivos de pontuação. Isso ajuda as pessoas avaliadoras a atuarem a partir dos mesmos parâmetros; 
  • Adote decisões coletivas: crie comitês avaliadores para avaliar um caso ou contratação. Isso reduz o peso da opinião individual, trazendo múltiplas perspectivas para uma mesma análise;

Enfrentando os vieses   

O primeiro passo para lidar com os vieses inconscientes é simples: reconhecer que eles existem. Eles afetam a todos nós, em decisões pessoais e profissionais, mesmo quando achamos que estamos sendo totalmente racionais. 

Entender como esses vieses funcionam e identificar seus diferentes tipos é o que permite trazer mais consciência para comportamentos automáticos, muitas vezes invisíveis no dia a dia. 

Essas ações abrem espaço para decisões mais justas, imparciais e alinhadas com os objetivos estratégicos da empresa

Na Mindsight, reconhecemos a importância de tomar decisões empresariais usando os recursos certos. Nosso sistema de gestão de talentos é formatado para potencializar esses esforços e garantir soluções efetivas, baseadas em dados e que apontem as decisões no ciclo de gente que melhor beneficiam sua empresa.

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